por Alan Moore
tradução desconhecida
(o texto não representa
necessariamente
a opinião do coletivo)
No meu quadragésimo aniversário em vez de aborrecer meus amigos com algo tão mundano como uma crise de meia-idade eu decidi que seria muito mais interessante aterrorizá-los ficando totalmente louco, me autoproclamando um mago.
Isso era algo que vinha se desenvolvendo há algum tempo que parecia ser um passo lógico na minha carreira de escritor. O problema com a magia é que, em muitos aspectos, constitui uma ciência da linguagem, temos que ser muito cuidadosos com o que se diz. Porque se repentinamente você declara a si mesmo como um mago sem ter os conhecimentos que isso implica, é provável que um dia você desperte e descubra que isso é exatamente o que você é.
Existe alguma confusão a respeito do que a magia é realmente. Penso que isso pode ser elucidado se você apenas olhar para as mais antigas descrições de magia.
Magia na sua forma mais antiga é referida como "A arte". Creio que isso seja completamente literal. Creio que a magia é arte e que esta arte, seja a escrita, a música, a escultura ou qualquer outra forma é literalmente magia.
A arte é, como a magia, a ciência de manipular símbolos, palavras ou imagens para operar mudanças de consciência. A verdadeira linguagem da magia trata tanto da magia quanto de arte e também sobre eventos sobrenaturais. Um grimório, por exemplo, um livro de feitiços, é um modo extravagante de falar de gramática. Conjurar um encantamento é somente encantar, manipular palavras para alterar a consciência das pessoas. Eu acredito que um artista ou um escritor são o mais próximo do que você pode chamar de xamã no mundo contemporâneo.
Creio que toda cultura deve ter surgido de um culto. Originalmente todas as facetas de nossa cultura, sejam as ciências ou as artes, eram território do xamã. O fato, nos dias atuais, é que esse poder se degenerou ao nível do entretenimento barato e manipulação, o que é uma tragédia. Atualmente quem usa o xamanismo e a magia para dar forma a nossa cultura são publicitários. Em lugar de despertar as pessoas, o xamanismo é usado como um opiáceo para entorpecê-las, para fazê-las mais manipuláveis. A sua caixa mágica chamada televisão, com suas palavras mágicas, slogans, pode fazer com que todos no mesmo país pensem com as mesmas palavras e tenham os mesmos pensamentos banais exatamente no mesmo momento.
Em toda magia há um componente linguístico incrivelmente grande. A tradição mágica dos bardos colocavam estas pessoas num lugar mais alto e mais temido que um mago. Um mago pode te amaldiçoar. Coisa que pode fazer com que tuas mãos se movam graciosamente ou poderia ter um filho com um pé de pau. Um bardo não te amaldiçoaria, faria uma sátira, coisa que poderia te destruir. Se fosse uma sátira brilhante não te destruiria apenas ante os olhos dos seus sócios, te destruiria ante os olhos de sua própria família, e te destruiria ante teus próprios olhos. E se fosse uma sátira finalmente elaborada e muito astuta, o bastante para sobreviver e ser recordada durante décadas, inclusive por séculos, então anos depois de sua morte, as pessoas a leriam e ririam de ti, de tua ruína e do teu absurdo.
Os escritores e as pessoas que podiam comandar outras pessoas eram respeitados e temidas como sujeitos que manipulavam a magia. Nos últimos tempos, porém, os artistas e os escritores tem permitido serem vendidos, serem levados pela maré. Aceitaram a crença predominante de que a arte e a escrita são simplesmente formas de entretenimento. Não são vistas como forças transformadoras que podem mudar a um ser humano ou a uma sociedade. São vistas simplesmente com entretenimento. Coisas com as quais podemos nos ocupar vinte minutos por dia, ou meia hora, enquanto esperamos morrer. Não é trabalho do artista entregar ao público aquilo que o público deseja, pois se assim fosse, o público não seria o público, e sim, seriam o artista. É trabalho do artista dar ao público aquilo que ele mesmo, o artista, necessita.
Minha carreira como mago segue evoluindo, desde o momento em que descobri que, em certo ponto, a arte e a magia são intercambiáveis. Parecia natural que a arte fosse o meio pela qual eu expressasse minhas ideais mágicas (...)

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